Vivemos a era da comunicação. Tudo se sabe. Não escapa nada a ninguém.
- A menina leu aquilo?
- Li. É incrível não é?
- Pois é. Como é que pode!
- Pois é! Que absurdo.
Lemos, ouvimos, vemos. Tudo soa estrondosamente verdadeiro. Dito daquela forma não há como por em causa.
- Bem, isso já depende do ponto de vista.
- A menina está parva? Então não ouviu o que ele disse? Não tem o que por em causo. O homem é um idiota. Está completamente ultrapassado.
- Sim. Mas em que contexto ele disse...
- Mas, qual contexto? O homem é um energúmeno. Devia era ser fuzilado.
Tudo passa pela peneira. A mesma que tapa o sol.
- Então? O teu Benfica lá ganhou com a ajuda do árbitro hein?
- Qual ajuda? O homem enganou-se. Só que lá está é que sabe o que custa.
- Então, mas a semana passada não disseste que foram roubados? Já não se aceitam os erros?
- Aquilo foi diferente. Ali teve dedo corrupto.
Democracia e ignorância, quando misturados, são uma mistura explosiva. Todos falam, todos se acham com a razão e ninguém pára para medir os “prós e os contras”. Pior, ninguém respeita a opinião do outro.
- A não ser que o gajo pense como eu. Aí está certo.
- Pois, já me tinhas dito.
Hoje, todos se podem expressar livremente e ter acesso a canais de comunicação. Sim, que a opinião é um direito constitucional.
- Viste? O Sapo deixou de exibir os comentários das notícias.
- pois é, o pessoal excedeu-se.
E, de liberdade em liberdade, se for a minha claro, cai-se na libertinagem.
- A menina defina liberdade, por favor.
- Bem, liberdade é... liberdade... é o direito de... Olhe, não sei definir liberdade.
- Não sabe? A menina com essa idade não sabe definir liberdade? Lamento, mas tenho que lhe dar um zero.
- E, já agora, para não ficar na ignorância, o professor podia então defini-la para mim?
- Minha menina, tenho mais o que fazer.
Que bom que todos andamos tão bem informados e temos conhecimento de tudo.
- Foda-se que é de Coruche.
- E o senhor é de onde?
- Eu sou de Santarém.
- Então foda-se também.